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Esses são os verdadeiros descendentes de Lampião e Maria Bonita. Na foto, Expedita Ferreira, filha de Lampião, aparece com seus quatro filhos: Vera Lúcia, Dejair, Iza Cristina e Gleuse Meire.

A estética nordestina, também chamada de estética sertaneja ou estética cangaceira, é resultado de um longo processo histórico e cultural que atravessa séculos, refletindo a dureza, resistência e criatividade do povo do sertão brasileiro. Esta evolução estética se manifesta, sobretudo, na forma de vestir, nas funções sociais e nos símbolos de pertencimento das figuras que moldaram o imaginário nordestino: o vaqueiro, o jagunço, o “jagunceiro” e o cangaceiro.
Vaqueiro: o primeiro símbolo da estética sertaneja
Considerado o tipo de trabalhador mais antigo do Brasil, o vaqueiro surgiu no século XVI, na Bahia, como uma figura essencial na expansão da pecuária, atividade econômica que moldou o território e a cultura nordestina. Sua estética nasceu da necessidade: o uso do couro de boi e de bode — materiais abundantes e resistentes — se transformou em vestimentas protetoras contra os espinhos da caatinga, funcionando como uma verdadeira “armadura”.
Além das peças encouradas que cobriam o corpo, um dos elementos mais marcantes é o chapéu de aba dobrada para cima, permitindo maior visibilidade durante as perseguições ao gado. O vaqueiro, com sua estética única e funcional, se consolidou como um dos principais legados culturais da Casa da Torre de Garcia d’Ávila, importante estrutura fundiária e militar no Brasil colonial.
Jagunço: o vaqueiro armado
A estética e a função do vaqueiro evoluíram, no século XVII, para a figura do jagunço. Inicialmente, estes eram vaqueiros armados que atuavam como capangas na segurança dos latifundiários e das grandes fazendas, especialmente nas margens baianas do Rio São Francisco. Sua presença foi fundamental na resistência contra as invasões holandesas que avançavam de Pernambuco em direção ao norte da Bahia.
Os jagunços vestiam-se de maneira muito similar aos vaqueiros, com o couro protegendo todo o corpo, o que lhes rendeu a alcunha de “soldados medievais da Casa da Torre”. A função militar, aliada à estética encourada, estabeleceu uma imagem poderosa e temida, símbolo de autoridade e resistência nas terras do sertão.
“Jagunceiro”: a transição para o cangaço
Embora o termo “jagunceiro” não seja academicamente correto, ele serve para descrever um tipo intermediário entre o jagunço e o cangaceiro, presente especialmente entre o final do século XIX e o início do século XX. Esses indivíduos, muitas vezes antigos jagunços, passaram a atuar de forma mais autônoma, sendo considerados, por alguns estudiosos, como “cangaceiros pré-Lampião”.
Diferentemente dos jagunços tradicionais, os “jagunceiros” adotavam um estilo menos pesado: restringiam o uso do couro ao chapéu, combinando-o com roupas simples e práticas. Sua estética é, muitas vezes, confundida com a dos revolucionários mexicanos, embora não exista qualquer ligação histórica entre ambos. Presentes sobretudo na Bahia, Pernambuco, Ceará e Paraíba, os “jagunceiros” foram figuras fundamentais na formação da estética que, mais tarde, seria imortalizada pelos cangaceiros.
Cangaceiro: a estética estilizada da resistência
O cangaceiro, ao contrário do jagunço, consolidou-se como uma figura própria e independente, marcando profundamente a cultura e a identidade do Nordeste. Embora o fenômeno do cangaço tenha antecedentes históricos — como o Cabeleira, em Pernambuco —, a estética cangaceira que hoje reconhecemos só emergiu na década de 1920, com a liderança de Virgulino Ferreira da Silva, o famoso Lampião.
Sob sua liderança, o cangaço atingiu um novo patamar: a estética se tornou elaborada, estilizada e até mesmo luxuosa, com chapéus de couro enfeitados, lenços coloridos, cartucheiras cruzadas e peças artesanais repletas de símbolos. Esse visual exuberante refletia não apenas a necessidade de proteção no ambiente hostil do sertão, mas também uma afirmação de identidade, resistência e desafio frente ao poder estatal.
Os cangaceiros formavam bandos compostos por indivíduos de diversos estados nordestinos — Bahia, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Paraíba, Ceará e Rio Grande do Norte —, circulando livremente pelo semiárido, espalhando a cultura e consolidando a estética que hoje se confunde com a própria imagem do sertão.
A estética nordestina como patrimônio cultural
A evolução da estética nordestina não é apenas uma sucessão de estilos ou roupas, mas sim uma narrativa viva sobre a adaptação do homem ao seu meio, a resistência cultural e a valorização das raízes sertanejas. De armaduras de couro bruto a vestimentas estilizadas, cada figura — vaqueiro, jagunço, “jagunceiro” e cangaceiro — representa um capítulo dessa história, profundamente entrelaçada com a ocupação e transformação do Nordeste brasileiro.
Hoje, essas estéticas são preservadas e celebradas em festas, literatura, música e produções artísticas, afirmando-se como símbolos identitários do sertão e de sua gente, resistentes e orgulhosos de sua história.
Referências:
DOS SANTOS, Laina Ramos. Nordeste – da ocupação às mudanças que influenciam os hábitos e modificam os estilos de vida. Revista ComSertões, v. 1, 2017.
MATTA, Alfredo. Licenciatura em História – História da Bahia. UAB/UNEB, 2013.
IPAC – Ofício de Vaqueiro.
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