“CARTA A LÉO LINS: quando o humor vira crime, no Brasil que rouba seus aposentados.”

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A notícia da condenação do humorista Léo Lins a oito anos de prisão, acompanhada de multa milionária, repercutiu intensamente entre colegas e admiradores da comédia brasileira. No momento em que soube da sentença, participava de um concurso de imitações entre amigos — ironicamente, eu imitava o autor da chamada “Lei Anti-Piada”. A notícia, no entanto, calou o riso.
Um amigo advogado que estava presente comentou: “Amigos, só mesmo vocês para me fazer rir nestes tempos…”
Na semana passada, celebramos São Filipe Néri, padroeiro dos comediantes, que dizia: “Um coração alegre está mais perto de Deus”. A frase resume bem a razão pela qual ditadores historicamente odeiam o humor: alegria e riso são armas potentes contra regimes que se sustentam sobre o medo e a mentira.
Não é um fenômeno novo. A lembrança vai ao poeta russo Ossip Mandelstam, que, durante o auge do terror soviético, ousou ridicularizar Stálin em um poema de apenas 16 versos. A comparação dos dedos do ditador a vermes e de seus bigodes a uma barata foi suficiente para selar seu destino: morreu na prisão em 1938, após ser capturado pela máquina repressiva soviética.
Casos como o de Mandelstam se repetem ao longo da história e pelo mundo afora. O humor, como linguagem corrosiva e reveladora, é alvo preferencial de regimes autoritários. O artista plástico e performer cubano Luis Manuel Otero Alcántara apodrece nas prisões de Cuba; o humorista venezuelano José Rafael Guzmán teve de fugir do país; na Alemanha nazista, a Gestapo caçava humoristas judeus; na Alemanha Oriental, agentes da Stasi perseguiam quem ousasse contar piadas sobre o regime.
No Brasil, não é diferente. Humoristas como Chico Anysio, Jô Soares, Agildo Ribeiro e Os Trapalhões, que faziam piadas politicamente incorretas até mesmo na ditadura militar, hoje, provavelmente, seriam alvo de processos movidos por representantes do Judiciário, como a juíza Barbara de Lima Iseppi, responsável pela condenação de Léo Lins. Curiosamente, a magistrada teve como orientador acadêmico o professor Mauro Iasi, conhecido por declarações polêmicas, como a de 2015, quando falou em oferecer “boa bala” e “boa cova” aos conservadores.
Apesar do cenário sombrio, há quem mantenha a esperança. A lembrança vai à clássica figura do Bobo na peça Rei Lear, de Shakespeare — o único personagem que ousava dizer a verdade ao monarca: “Agora eu sou o Bobo, e você é nada”.
Assim como o Bobo, o comediante persegue a verdade, ainda que ela custe caro. Talvez um dia Léo Lins possa, diante de seus algozes, repetir essa frase. Mas, hoje, lamentavelmente, a liberdade de expressão no Brasil parece estar, como ironizou o autor deste texto, “em Lins: lugar incerto e não sabido”.
Por Paulo Antônio Briguet
Blog Sem ARRUDEIO